faz de conta que és uma criança e eu um balão flutuante, redondo, vermelho, atado ao teu pulso por um cordel. Não me deixes voar para longe, tenho medo da noite e do espaço. O espaço deve ser uma imensa solidão sem música. Não é lugar para um balão vermelho como eu.
É a última noite e fizeram explodir no ar serenas flores douradas, que agora vejo de longe: atravessei para o outro lado do rio e da vida, já não tenho a capa sobre os ombros, nem os sapatos cheios de pó, nem choro a saudade antecipada de uma história que parece ter sido noutro século e parece ter acontecido noutro planeta. Nada disto perdeu a importância, ou o sentido, mas perdeu o tempo de fazer sentido. Para tudo existe um tempo, e aquele já passou. Vivi-o, assinei-o, recordo-o e guardo-o outra vez na gaveta.
As flores que explodem serenamente no céu nocturno não são tão belas como o teu sorriso, nem tão luminosas como o teu jeito de rainha, nem tão grandes como os teus braços capazes de abraçar o mundo _ o teu coração capaz de conter o mundo (e mais mundos houvesse). E o mundo dentro dos teus olhos tão sem impossíveis.
Nunca te disse (conforme nunca te disse tantas outras coisas) que os olhos da tua mãe me dão vontade de chorar por conterem tanta bondade. E que tens em ti a mesma ternura. Nem te disse que, quando Coimbra acabou, o que mais desejei trazer comigo para esta outra vida foste tu. Segurar-te com força nas mãos para não te perder nunca. E não te perdi, eu sei. Soube-o naquela noite em que fizemos desaparecer toda a gente à nossa volta, e restámos só nós as duas, e falámos de Deus, e chorámos. Sei-o de todas as vezes que ouço a tua voz e sinto que estendes os braços por cima da distância para me abraçar.
Quero dizer-te que também não me perdeste. Que nesta noite, mais do que em qualquer outra, penso em ti. E que a força que tenho é a mesma que tens. E só dá mais encanto aos nossos corações de manteiga. Mas isto já tu sabias.
Hoje, em conversa de lava-loiça com a C., chegamos à conclusão de que, provavelmente, não haverá nada mais eficaz contra este problema masculino que a famosa "bruxa da tusa".
Já sabem: perante uma precocidade eminente gritem: POMBA GIRA! Mas depois não se queixem se a festa ficar por aí...
uma varanda sobre o mar ao fim da tarde, e a dança dos corpos (planos de luz interceptados)
"É, só eu sei, quanto amor eu guardei Sem saber que era só pra você É, só tinha que ser com você Havia de ser pra você Senão era mais uma dor Senão não seria o amor Aquele que a gente não vê O amor que chegou para dar O que ninguém deu pra você O amor que chegou para dar O que ninguém deu pra você
É, você que é feito de azul Me deixa morar neste azul Me deixa encontrar minha paz Você que é bonito demais Se ao menos pudesse saber Que eu sempre fui só de você Você sempre foi só de mim Que eu sempre fui só de você Você sempre foi só de mim"